Um dia após grandes e pacíficas manifestações pela sua saída imediata
do poder, o contestado presidente do Egito, Hosni Mubarak, reuniu seus
principais ministros da área econômica neste sábado (5) no Cairo.
A reunião incluiu o primeiro-ministro e os ministros de Finanças,
Petróleo, e Comércio e Indústria. O presidente do Banco Central do Egito
também participou. O teor da reunião não foi divulgado pela mídia
estatal.
Na véspera, cresceu a pressão internacional para que Mubarak comece
imediatamente a transição democrática no país, em meio a grandes
protestos de rua no Cairo, em Alexandria e outras cidades do país.
O presidente dos EUA, Barack Obama, pediu a Mubarak, que "preste
atenção" nos apelos de manifestantes por uma transição ordeira e disse
que o Egito não pode mais voltar aos "velhos tempos".
Obama insistiu em que a transição política no país em crise deve
começar agora, mas que os detalhes do processo devem ser definidos pelos
egípcios. Ele não falou explicitamente em renúncia.
"O futuro do Egito será determinado por seu povo", disse, em entrevista ao lado do premiê do Canadá, Stephen Harper.
Pouco antes, a Casa Branca afirmou que o governo do Egito precisa dar
"passos concretos" em direção a uma transição ordeira de poder. Sem
isso, segundo o governo dos EUA, os conflitos vão persistir no país, em
crise política há 12 dias.
O porta-voz da Casa Branca, Robert Gibbs, convocou Mubarak e seu
governo a sentar-se com uma ampla coalizão da oposição e grupos da
sociedade civil excluídos do poder no Egito para discutir um novo acordo
político.
Gibbs deu a entender que o único caminho para acabar com a crise seria a
renúncia de Mubarak rapidamente, seguindo informações de que Washington
estaria tentando promover a saída do líder egípcio do poder.
O secretário de Defesa dos EUA, Robert Gates, voltou a falar com seu
colega egípcio, Mohamed Hussein Tantaoui, sobre a crise, segundo o
Pentágono.
Líderes da União Europeia também insistiram na necessidade da transição imediata durante reunião de cúpula em Bruxelas.
Mas o recém-nomeado premiê do Egito, Ahmed Shafiq, disse que é
"improvável" que o contestado Mubarak transfira seus poderes
imediatamente para seu vice, Omar Suleiman. "Precisamos do presidente
por razões legislativas", disse ele em entrevista à TV Al Arabiya.
Mubarak nomeou Suleiman como vice-presidente após a pressão de
manifestantes, preenchendo o cargo que estava vago desde que assumiu a
presidência, em 1981.
'Dia da saída' Dezenas de milhares de egípicios oraram na Praça Tahrir, no centro do
Cairo, nesta sexta, pedindo a saída imediata de Mubarak, no que a
oposição chamou do "Dia da Saída".
Os oposicionistas pressionavam para que o presidente deixasse o poder ainda nesta sexta, depois de quase 30 anos no governo.
"Hoje é o último dia!", gritavam os manifestantes, enquanto
alto-falantes tocavam música pop árabe, e helicópteros militares
sobrevoavam o local. Soldados mantinham a ordem sem intervir, e havia
ambulâncias de prontidão.
Em inglês - para atender à audiência televisiva global - um cartaz declarava: 'Game over' (fim de jogo).
A oposição pediu que todos fossem às ruas, apesar dos confrontos dos
dois dias anteriores -que deixaram 11 mortos, segundo o ministro da
Saúde, Ahmed Sameh Farid.
'Estou farto', diz Mubarak Nesta quinta-feira (3), o presidente do Egito afirmou que quer deixar o
governo, mas teme o "caos" caso ele saia agora. A declaração foi feita à
jornalista Christiane Amanpour, da TV americana ABC.
"Estou farto. Depois de 62 anos no serviço público, já foi o bastante.
Quero sair", disse ele, que enfrenta o décimo dia de crescentes e
violentos protestos da oposição. "Não importa o que pensem de mim",
disse na entrevista, que durou 20 minutos. "O que importa é o meu país, é
o Egito."
Ele negou que seu governo seja o responsável pela violência na Praça
Tahrir e responsabilizou os oposicionistas da Irmandade Muçulmana pelos
confrontos.
Desde o início dos protestos, que já duram dez dias, pelo menos 100
pessoas morreram, mas, segundo a ONU, esse número pode chegar a 300. De
acordo com a TV Al Jazeera, o número de feridos teria passado de 1.500.
Não há cifras oficiais, e os números são frequentemente contraditórios.
Os antigovernistas afirmaram na quinta que detiveram e identificaram
120 manifestantes pró-Mubarak, e que eles seriam, em sua maioria,
ligados às forças de segurança e ao partido governista.
Musa O chefe da Liga Árabe, Amr Musa, foi nesta sexta à praça Tahrir, informou seu gabinete, como um gesto de "apaziguamento".
[Tens de ter uma conta e sessão iniciada para poderes visualizar esta imagem]Dados do Egito (Foto: Editoria de Arte / G1) O ex-chanceler egícpio, muito popular em seu país, admitiu em
declarações à rádio francesa Europe 1 que está avaliando a possibilidade
de suceder Mubarak, apesar de acreditar que o chefe de Estado egípcio
permanecerá no cargo até terminar seu mandato, no final de agosto.
Levantes em outros países O presidente da Argélia, Abdelaziz Bouteflika,anunciou que vai levantar o estado de emergência que vigora há 19 anos, aumentando as liberdades políticas. Ele também prometeu investir na criação de empregos.
Na quarta, o presidente de Iêmen, no poder há 32 anos, cedeu a protestos da oposição e disse que não vai tentar a reeleição. Nesta quinta, protestos favoráveis e contrários ao governo tomavam as ruas da capital, Sanaa.
No Cazaquistão, o presidente Nursultan Nazarbaiev convocou nesta sexta-feira (4) um decreto que convoca eleições presidenciais antecipadas para 3 de abril, poucos dias depois de ter descartado uma prorrogação por plebiscito de seu mandato.
Nazarbaiev, de 70 anos, anunciou na segunda-feira que convocaria eleições antecipadas, ao mesmo tempo que rejeitou um referendo para prolongar até 2020 seu mandato, como desejava o Parlamento.
Os protestos em Egito e Jordânia -assim como Marrocos, Iêmen, Síria e outros países muçulmanos- foram inspirados pelo levante popular que derrubou o presidente da Tunísia, Zine El Abidine Ben Ali, que caiu pela pressão popular após 23 anos no poder.
País chave
O Egito, o mais populoso dos países árabes (80 milhões de habitantes), é importante aliado do Ocidente na região e administra o Canal de Suez, essencial para o abastecimento de petróleo dos países desenvolvidos.
Além disso, é um dos dois países árabes (o outro é a Jordânia) que assinou um tratado de paz con Israel.
O premiê israelense, Benjamin Netanyahu, mencionou o fantasma de um regime ao estilo iraniano, caso, aproveitando o caos, "um movimento islamita organizado assuma o controle do Estado".
O turismo é uma das maiores fontes de receita do exterior no Egito, sendo responsável por mais de 11% do PIB e fonte de empregos, em um país com alto índice de desemprego. Cerca de 12,5 milhões de turistas visitaram o Egito em 2009, proporcionando receita de US$ 10,8 bilhões.
O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, considerou "escandalosa e completamente inaceitável" a repressão contra os meios de comunicação e defensores dos direitos humanos, em declarações feitas nesta quinta-feira em Berlim.
'Campanha contra a imprensa'
O Departamento de Estado dos EUA denunciou nesta quinta o que seria uma campanha organizada contra os meios de comunicação estrangeiros que cobrem a rebelião popular contra Mubarak.
"Assistimos a uma campanha organizada a fim de intimidar os jornalistas estrangeiros no Cairo e perturbar seu trabalho de reportagem", afirmou o porta-voz da diplomacia americana, Philip Crowley, em seu Twitter.
O grupo Repórteres Sem Fronteiras também condenou a intimidação.
Jornalistas de vários países -inclusive do Brasil- foram alvo de graves ataques e intimidações por parte de partidários do presidente Mubarak, que os acusa de tentar desestabilizar o regime.